15 setembro 2011

Amor de avó e neta



          Por vezes gratidão e reconhecimento tomam forma de mulher, a partir dos tempos idos de criança...

          O dourado das madeixas loiras de tão pueril criança, soltas pelos pequenos ombros ao correr pelo longo corredor... As pernas ainda curtas atestam a fragilidade de seus passos. O sorriso largo e cristalino ao receber os mimos e presentes doados pelo coração de avó... Os bracinhos ainda eram muito curtos para retribuir as manifestações de afetos recebidas. Mas sem saber, já agradecia com sua infantil presença.

         O calendário do tempo corre inexorável traduzindo as mudanças no corpo e na alma... Vemos que a madureza dos corpos corre em progressão aritmética, pois enquanto para uma descortina todo o horizonte de realizações e projetos pessoais, para a outra em contrapartida, a desaceleração da coordenação física é visível.

        A candura e paciência da neta querida põem à prova o afeto recíproco, urdido por longos anos... Se outrora, aquela pequena criança foi alvo dos cuidados e atenção da avó dedicada, agora o cenário da vida se inverte, e o que vemos claramente, é a gratidão e o amor tomar forma e significado. Agora, não mais os pequenos passos do pretérito no longo corredor. Agora eram passos mais longos e firmes da acadêmica em Medicina, que adentram a velha casa, que fora o cenário de tantas recordações... O mesmo olhar, o mesmo sorriso, os mesmos elogios de um coração que mesmo nas adversidades da vida, nunca esqueceu de amar, a recepcionam. A balsamizante bênção lhe conforta o íntimo e lhe fortalece para os embates do dia a dia. O almoço e o sono antes de voltar pra mais uma bateria de aulas, lhe revigoram...

      Quantos encontros, quantos passeios ao shopping, quanta cumplicidade escondida pela sombra do tempo...

      O destino é tão imprevisível quanto irônico. Um trágico incidente, põe mais uma vez à prova tanto amor e dedicação da neta... Foram dias de zelo, cuidado e doação... O sofrimento no coração descompassado pela dor e pela dúvida acerca do tempo que ainda restava... Quantas lágrimas enxugadas às escondidas... Quantas esperanças confidenciadas em sentidas orações. Até que um dia, teve Deus a certeza do chamado que iria fazer...

      A dor lancinante tornava frágil o coração de menina pela perda de sua grande amiga, que foi levada pelas asas do tempo. Não mais o sorriso, não mais o aconchego, não mais os lentos passos dados em sincronia com sua querida avó... Agora, é só saudade...

     Floripes, ou sua doce Flor de Lis, que se desprendeu do jardim familiar e ainda hoje, paira acima de sua saudade...

 

Karina Alcântara

14 setembro 2011

Calmaria...



A brisa suave acariciava-me a fronte.
Olho para o infinito e me reporto...
Ao doce acalanto do azul impávido,
Deixo-me embalar em doces vagas...

Calmaria...

Leve torpor me vence a alma,
Entrego-me a mansa letargia que me resta.
Passando por horas esquecidas, sigo
No pensamento que me leva...

Em silente calmaria...

Karina Alcântara



06 setembro 2011

Outono


O outono tingira a paisagem com seus tons dourados.
Ao espraiar-se o olhar sobre o horizonte, distinguia-se claramente, a amálgama de tons outonáceos na planície de plátanos.
A cada bafejar da brisa fria da tarde, punha a se formar um rico tapete como que rebordado em ouro, a se estender no solo.
O sol ainda teimava em ostentar a calidez dos seus raios, na sua despedida rotineira.
O silêncio total reinava soberano naquelas paragens...
Ali era o local ideal para viagens contemplativas, usando-se o recurso da meditação.
Chegavam aos meus ouvidos, a cada passo articulado, somente o farfalhar surdo das folhas secas deitadas no solo úmido.
O caminho levava a uma alameda cuja sombra fazia-se penumbra.
Finalmente avistei as galhadas baixas da árvore da minha infância. E logo adiante, repousando em águas tranqüilas, o velho barco, que tantas recordações agora me proporciona.
Por uns instantes, estaquei com os olhos úmidos a mirar o lago, como a aguçar em minha mente a paisagem da época dos folguedos da infância, onde vínhamos no verão para passeios de barco e mergulhos inesquecíveis...
Lembranças que me refazem o íntimo...
Quase posso ouvir os gritos e o riso fácil e cristalino a ecoar por entre os arvoredos.
Um tempo que vai longe, mas que ainda hoje é terapêutico nas minhas reminiscências.
Sentei-me no barco e fiquei a divagar por algum tempo, como a experimentar novamente as velhas sensações de um tempo mágico.
Então, despertando do enlevo, pus-me ao caminho de volta, e quando alcancei a casa, as primeiras estrelas já apontavam no firmamento...

Karina Alcântara

03 setembro 2011

Primeiro amor

No olhar, o primeiro encontro...

A cumplicidade se estabelece entre as coincidências do magnetismo que funde dois corações.

A vida segue em confidências silenciosas.

Sonhos em plena vigília povoam mundos particulares.

O anseio e a saudade mesclam-se na euforia do amor

Que por vezes num misto de dor e alegria,

Remete-nos ao paraíso...

 

Karina Alcântara 

Papillons


Quisera eu ter a leveza de tuas asas,            

E voaria livre por entre os prados dos meus sonhos.

Quisera eu ter a leveza de tuas asas,

E desbravaria cantos e encantos reservados ao meu coração.

Quisera eu ter a leveza de tuas asas,

E roçaria de leve a beleza de tua alma...

 

Karina Alcântara

02 setembro 2011

Doce prazer



As cerejeiras estavam carregadas...

Logo que se abria a porta da cozinha era o cartão postal que se avistava. Dava gosto de se ver, carregadinhas de frutos.

As galhas baixas salpicadas de um vermelho vivo e intenso, chegava a dar água na boca!

Foi a primeira providência da manhã... A idéia já começava a tomar forma e passando o braço na cestinha de vime, dirigiu-se ao quintal da casa.

O dia amanhecera sereno e o cheiro úmido ainda recendia aos olfatos mais sensíveis.

A noite passada havia sido demasiado fria e ainda podia ver-se ao longe, nuvens carregadas, prenunciando aguaceiros próximos.

Não titubeou e pôs-se a passos firmes, demandando o caminho que conduzia às cerejeiras.

O vento lá fora, apesar de ameno, soprava frio, e fazia com que as faces de Helena ruborizassem.

As botinas estavam umedecidas pela relva molhada, mas foram confeccionadas com material próprio para aquela situação. Tão surradas e cheia de histórias...

Enfim chegou ao seu destino e pôs-se ao propósito a que se submetera. Em curto espaço de tempo, a cestinha já estava abarrotada de cerejas de casca lustrosa e de uma cor viva que instigava qualquer criatividade... Mas ela já tinha em mente o projeto culinário a que iria submeter-se e aprestou- se a retornar para casa e preparar o repasto da manhã.

Sim, faria a tão desejada torta de cereja, que, logo, logo despertaria os que ainda encontravam-se adormecidos...

 

Karina Alcântara